O poder pressupõe simplesmente a
possibilidade de impor a vontade a outrem, mesmo contra toda
resistência. “Manda quem pode, obedece quem tem juízo”.
Os meios que o poder utiliza para subjugar são diversos: violência,
poder econômico, influência social, capacidade de ludibriar, etc. O
poder espera a obediência pelo simples fato de ser poder, sem
qualquer fundamento que legitime o mando. Como afirma Rousseau, em Do
Contrato Social: “Ceder à força constitui um ato de necessidade,
não de vontade; quando muito, ato de prudência”. Nesta
perspectiva, o poder é a forma mais grosseira de se fazer obedecer.
Aprendemos que a dominação requer a
probabilidade da obediência, ou seja, da aceitação do mando
legitimado. A autoridade é reconhecida como legítima, seja pelo
costume e a tradição (dominação tradicional), pelo carisma
(dominação carismática) ou pela legalidade em que se fundamenta
(dominação legal). São tipos puros de dominação, na realidade
concreta a mesma autoridade pode apresentar aspectos legais,
tradicionais e carismáticos.
A dominação legal, própria das
organizações burocráticas, públicas ou privadas, pressupõe a
crença na validade dos regulamentos e leis estabelecidos
racionalmente; que todas as decisões, decretos e ordens de serviço
sejam documentados, isto é, escritos; a legitimidade dos chefes
designados por sua competência funcional e a hierarquia racional.
Seu fundamento é a racionalidade, impessoalidade e ausência de
emoções. Nas palavras de Max Weber: “Obedece-se não à pessoa em
virtude do seu direito próprio, mas à regra estatuída, que
estabelece ao mesmo tempo a quem e em que medida se deve obedecer.
Também quem ordena obedece, ao emitir uma ordem, a uma regra “lei”
ou “regulamento” de uma norma formalmente abstrata”. [1]
Consideremos o exemplo da universidade
pública. Como uma empresa moderna, ela organiza-se segundo uma
hierarquia racional burocrática, mas com a diferença de que muitos
dos seus cargos são eletivos. Assim, a autoridade dos seus ocupantes
repousa sobre dupla legitimidade: o estatuto e a anuência dos seus
pares. Os cargos de chefia, direção, membros de conselhos,
reitoria, etc., são instituídos por regras estatutárias, mas os
indivíduos que almejam tais posições precisam ser eleitos,
conquistar o consentimento. Ainda que as regras sejam
antidemocráticas, pois os critérios do peso do voto não se pautam
pela paridade, e que os eleitos se sintam protegidos até a próxima
eleição, quando, novamente, precisam reconquistar o apoio dos
eleitores, as autoridades dependem da sua “base de legitimidade”
e necessitam, para exercerem a dominação legítima, aterem-se ao
estatuto, aos regulamentos e normas estabelecidas. Não é
aconselhável perder de vista a transitoriedade da ocupação do
cargo e não confundir seu exercício com a função em si. A pessoa
do reitor é transitória, assim como o diretor do centro, a chefia
do departamento, etc.
Não é de bom alvitre confundir poder
com dominação legítima. A obediência pode resultar da imposição
do exercício autoritário da função ou se pautar pela aceitação
da autoridade legítima. O autoritarismo é uma deformação da
autoridade, expressa a incapacidade do detentor do cargo em manter a
crença na legitimidade. Em outras palavras, confunde respeito com
obediência a qualquer custo e age como se tivesse direitos privados
sobre a função que desempenha. Ser autoridade pressupõe,
sobretudo, respeito ao outro e observância às “bases da
legitimidade”. Afinal, de que servem as teorias se no cotidiano não
praticamos o que aprendemos?
[1] WEBER, Max. Os três tipos puros de
dominação legítima. In: COHN, Gabriel. (Org.) Sociologia: Max
Weber – Grandes Cientistas Sociais. São Paulo, Ática, 2003,
p.129.
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